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3ª seção do STJ julga se aprovação no Enem pode servir para remir pena
A 3ª seção do STJ iniciou, nesta quarta-feira, o julgamento do Tema 1.357, sob o rito dos repetitivos, que discute a possibilidade de remição da pena pela aprovação no Enem ou no Encceja quando o apenado já concluiu o ensino médio antes da prisão.
O relator, desembargador convocado do TJ/RS Carlos Cini Marchionatti, votou por negar provimento ao recurso especial do Ministério Público e manter o acórdão que havia reconhecido o direito do apenado à remição da pena pela aprovação no exame, mesmo já tendo concluído o ensino médio antes da prisão. Assim, sugeriu a seguinte tese:
"É possível a concessão do benefício da remição da pena, por aprovação no Enem ou no Encceja, quando o apenado tenha concluído o ensino médio ou outro grau de instrução superior, anteriormente ao início do cumprimento da pena."
Após a leitura da ementa, o julgamento foi suspenso em razão do pedido de vista do ministro Joel Ilan Paciornik.
Casos paradigmas
Os cinco recursos especiais afetados como representativos da controvérsia apresentam situações semelhantes de apenados que, mesmo já tendo concluído o ensino fundamental ou médio, buscaram a remição da pena pela aprovação em exames nacionais durante a execução penal.
No REsp 2.072.985, o Juízo da execução havia reconhecido a remição pela aprovação no Enem 2018 e no Encceja 2020. O TJ/DF manteve a decisão, destacando que a aprovação em exames nacionais comprova esforço de estudo válido durante a prisão, ainda que o apenado já tivesse concluído o ensino médio ou superior. O Tribunal apenas afastou a possibilidade de acréscimo de 1/3, por já haver formação anterior.
No REsp 2.073.005, o juiz de execução havia negado a remição por aprovação no ENEM, diante da conclusão prévia do ensino médio pelo apenado. O TJ/MG, entretanto, reconheceu o direito e determinou a remição de 100 dias, com base no art. 126 da LEP.
Já no REsp 2.082.712, o TJ/MG reformou decisão de primeiro grau e deferiu a remição de 177 dias da pena, após aprovação do apenado em todas as áreas do Encceja 2021. O acórdão considerou desnecessária a juntada de histórico escolar completo, por entender que o certificado de aprovação bastava para comprovar o esforço intelectual.
No REsp 2.082.999, o TJ/MG também reformou decisão de primeiro grau e determinou a remição de 133 dias da pena, com acréscimo de 1/3, diante da aprovação no Encceja. Para o tribunal, ainda que já houvesse conclusão anterior do ensino médio, o estudo por conta própria e a aprovação no exame evidenciavam dedicação válida para fins de remição.
Por fim, no REsp 2.117.779, o debate envolveu a conclusão do ensino fundamental pelo Encceja. O juiz da execução havia negado o benefício, mas o TJ/MG reconheceu a remição de 100 dias da pena, ressaltando que a aprovação em exame nacional comprova dedicação e fortalece a ressocialização. Para evitar duplicidade, determinou que os dias remidos por estudo regular fossem deduzidos.
Em todos os casos, o Ministério Público interpôs recurso ao STJ defendendo interpretação restritiva. O MPF, por sua vez, opinou pela admissão dos feitos sob o rito dos repetitivos, dada a multiplicidade de recursos sobre a matéria. A questão foi então consolidada no Tema 1.357, a fim de uniformizar o entendimento em âmbito nacional.
Sustentações orais
O MP/MG, representado pelo procurador de Justiça André Estevão Ubaldino Pereira, sustentou que a concessão da remição nesses casos geraria tratamento privilegiado em relação àqueles que, por condições sociais adversas, não tiveram acesso à educação.
Citando relatório do PNUD, destacou que 94% dos jovens das camadas mais ricas concluem o ensino médio, contra apenas 46% dos mais pobres, ressaltando que a evasão escolar decorre principalmente da necessidade de trabalho precoce.
Para o procurador, conceder remição automática apenas pela aprovação em exame equivaleria a dar um "bônus" a quem já teve todas as oportunidades, sem demonstrar esforço ressocializador durante a execução da pena.
Na mesma linha, o MPF, pelo procurador regional da República Roberto Luís Oppermann Thomé, afirmou que o art. 126 da LEP vincula a remição ao esforço efetivo de estudo e ressocialização do apenado. Explicou que a aprovação em exames como Enem ou Encceja, quando não resulta de dedicação no período de cumprimento da pena, não pode gerar abatimento, sob pena de esvaziar a finalidade do instituto.
Por fim, ressaltou ainda que a remição não é um fim em si mesma, mas deve funcionar como incentivo ao estudo e à reinserção social.
Já a Defensoria Pública de Minas Gerais, representada pelo defensor Antônio Soares da Silva Júnior, defendeu que a resolução 391/21 do CNJ autoriza expressamente a remição também pela aprovação em exames nacionais, ainda que sem matrícula formal, reconhecendo inclusive o estudo por conta própria como válido. Argumentou que negar o benefício seria punir quem buscou estudar em condições adversas.
Citou precedentes da própria 3ª seção do STJ e, ao final, requereu a fixação da tese de que é possível a concessão da remição pela aprovação no Enem ou no Encceja, ainda que o sentenciado já tivesse concluído o ensino médio antes da prisão.
Processos: REsp 2.072.985, REsp 2073005, REsp 2082712, REsp 2082999, REsp 2117779
Fonte: www.migalhas.com.br