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Devolução de valor por liminar revogada em ação coletiva é contestável em ação individual
Os beneficiários de uma ação coletiva não estão necessariamente submetidos aos efeitos desfavoráveis de uma decisão que determinou a devolução de valores já recebidos por liminar que acabou revogada.
A conclusão é da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, que fixou tese vinculante no julgamento de um incidente de assunção de competência (IAC).
A posição resolve o caso concreto e todas as ações conexas, mas é também um indicativo de como as instâncias ordinárias devem tratar a questão da devolução de valores graças a liminares revogadas em ações coletivas por todo o país.
O julgamento se deu por maioria de votos. Venceu a posição do relator, ministro Paulo Sérgio Domingues. Abriu a divergência e ficou vencida a ministra Maria Thereza de Assis Moura.
Liminar revogada
O caso concreto é o de um mandado de segurança coletivo ajuizado pelo Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Ades) pelo pagamento da URP/89 (Unidade de Referência de Preço), instituída no Plano Bresser.
Trata-se de um indexador econômico que, de 1987 a 1989, serviu para orientar o reajuste de preços e salários, em referência à inflação.
Nesse mandado de segurança, o Ades obteve uma liminar que levou professores da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) a receber diferenças de 26,05% de URP/89 por um período limitado, já que houve a posterior revogação.
O MS transitou em julgado com a determinação de devolução desses valores. Na sequência, vários professores passaram a ajuizar ações individuais para contestar o cumprimento dessa ordem judicial.
O caso chegou ao STJ em IAC devido ao número de ações individuais na Justiça de Santa Catarina contestando a devolução e à relevância da questão jurídica.
Sentença coletiva e decisão desfavorável
A conclusão da maioria encabeçada pelo ministro Paulo Sérgio Domingues é no sentido de que os professores beneficiados pela liminar revogada podem contestar a devolução dos valores em ações individuais, sem que isso viole a coisa julgada coletiva.
Isso porque o regime jurídico da coisa julgada nos processos coletivos indica que a sentença coletiva só alcançará os membros do grupo para beneficiá-los. Essa posição vem sendo aplicada pelo STJ em diferentes casos, até de forma vinculante.
Em ratificação do voto na quarta-feira (13/11), o relator esclareceu que a tese não desobriga a devolução de valores pelos professores, apenas garante a eles o direito constitucional de usar a ação individual para contestar essa medida.
“Claro que é muito provável que a consequência de uma ação dessas seja a determinação de devolução dos valores. Não estou entrando nesse mérito. A questão é que não se pode vincular os substituídos à coisa julgada que é desfavorável”, disse.
Votaram com o relator os ministros Teodoro Silva Santos, Afrânio Vilela, Benedito Gonçalves, Sérgio Kukina e Gurgel de Faria.
Teses aprovadas:
— Os docentes da UFSC que não tenham intervindo no mandado de segurança coletivo impetrado pelo Ades não estão submetidos ao efeito desfavorável da coisa julgada produzida nessa ação coletiva, não havendo óbice, nessa hipótese, a que a questão relativa à restituição de valores recebidos a título de diferenças de 26,05% de URP seja discutida em ações individuais ajuizadas por esses docentes;
— Não induz litispendência para com o mandado de segurança coletivo impetrado pelo Andes o ajuizamento de ações individuais pelos docentes da UFSC antes do trânsito em julgado da ação mandamental, ainda que idênticos os objetos da demanda.
Vinculação da coisa julgada
Abriu a divergência a ministra Maria Thereza, que ficou vencida, acompanhada por Marco Aurélio Bellizze. Para ela, a devolução dos valores pelos docentes é uma consequência automática que alcança os substituídos que se beneficiaram da ação coletiva.
Essa condenação, por ser genérica, pode ser discutida em ações individuais apenas quanto ao que for passível de alegação em impugnação ao cumprimento da sentença.
Será possível discutir, por exemplo, a especificação do devedor, do que é e do quanto é devido, mas não quanto à existência do dever de restituição, de acordo com a magistrada.
“A limitação dos efeitos da coisa julgada coletiva é apenas quanto à decisão de mérito, não alcançando o efeito da de restituição ao status quo”, sustentou a ministra Maria Thereza.
Ela propôs as seguintes teses:
1. A devolução dos valores recebidos em razão da medida liminar não confirmada em mandado de segurança coletivo decorre de responsabilidade objetiva e é um efeito automático da decisão que alcança os substituídos que se beneficiaram;
2. A condenação, a devolução de valores é uma condenação genérica que pode ser discutida em ação individual quanto à matéria passível de alegação em liquidação e em impugnação ao cumprimento da sentença, mas não quanto à própria existência do dever de restituição;
3. Os docentes da Universidade Federal de Santa Catarina, beneficiados pela medida liminar no mandado de segurança coletivo impetrado pelo Andes estão submetidos ao dever de restituir os valores recebidos no período de 17/07/2001 a 9/08/22.
IAC 17
REsp 1.860.219
Fonte: www.conjur.com.br