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Incentivos fiscais a agrotóxicos são constitucionais? STF julga


17/10/2025

STF começou a analisar, nesta quinta-feira, 16, em sessão plenária, duas ações que questionam incentivos fiscais concedidos a agrotóxicos, tema que abrange tanto dispositivos da reforma tributária (EC 132/23) quanto benefícios anteriores previstos em convênio do Confaz e em decretos federais.

As ADIns 5.553 e 7.755, propostas respectivamente pelo PSOL e pelo PV - Partido Verde, de relatoria do ministro Edson Fachin, contestam a redução e a isenção de tributos incidentes sobre produtos agrotóxicos, por entenderem que tais incentivos violam os direitos fundamentais à saúde e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

A sessão foi destinada a oitiva das sustentações orais e o caso será retomado na próxima semana, com os votos dos ministros.

 

Entenda

Na ADIn 7.755, o PV contesta dispositivos da EC 132/23, que instituiu a reforma tributária, bem como as cláusulas primeira e terceira do convênio ICMS 100/97 do Confaz.

Esses dispositivos reduzem em 60% a base de cálculo do ICMS e autorizam isenção total nas operações com insumos agropecuários, incluindo agrotóxicos.

O PV sustenta que tais incentivos estimulam o uso excessivo de produtos tóxicos, alguns proibidos em outros países, e violam o direito à saúde, à integridade física e ao meio ambiente equilibrado.

O partido também questiona o art. 9º, § 1º, XI, da reforma tributária, que autoriza futura lei complementar a definir operações beneficiadas por alíquotas reduzidas, abrangendo fertilizantes e defensivos agrícolas.

Já a ADIn 5.553, proposta pelo PSOL, questiona especificamente o convênio ICMS 100/97 e o decreto 7.660/11 (posteriormente atualizado), que fixaram redução e isenção de IPI e ICMS para agrotóxicos.

A legenda argumenta que as normas concedem tratamento tributário privilegiado a substâncias nocivas, criando uma "essencialidade às avessas".

 

Plenário virtual

O julgamento da ADIn 5.553 começou no plenário virtual, em 2020, com o voto do relator, ministro Edson Fachin, pela procedência da ação.

Fachin entendeu que a renúncia tributária sobre produtos perigosos viola os arts. 196 e 225 da CF, que asseguram o direito à saúde e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Em seu voto, o relator destacou pareceres do INCA e da Fiocruz, que associam o uso intensivo de agrotóxicos ao aumento de doenças e à contaminação ambiental.

Para o ministro, a política fiscal em vigor contraria o dever estatal de proteger a saúde e o meio ambiente para as presentes e futuras gerações.

Ministra Cármen Lúcia acompanhou o relator, com ressalvas de fundamentação, defendendo que a transição para uma política fiscal sustentável deve ocorrer de forma gradual, sem abalos à cadeia produtiva.

S. Exa. recordou precedentes como a ADPF 101 (proibição de importação de pneus usados) e as ADIns sobre o amianto crisotila, reforçando a evolução da Corte na proteção ambiental.

Ministro Gilmar Mendes divergiu e votou pela improcedência, sustentando que os benefícios são instrumentos legítimos de política agrícola e que a retirada imediata dos incentivos poderia impactar o preço dos alimentos.

S. Exa. foi acompanhada pelos ministros Zanin, Toffoli e Moraes.

Ministro André Mendonça abriu divergência parcial, reconhecendo a existência de um "processo de inconstitucionalização" das desonerações fiscais, mas propôs uma transição controlada.

Defendeu que os Executivos federal e estaduais realizem, em até 90 dias, uma avaliação técnica e econômica dos benefícios, considerando toxicidade, impactos fiscais e alternativas tecnológicas.

Ministro Flávio Dino apresentou voto-vogal acompanhando a divergência com ressalvas.

Para S. Exa., as normas estão em "trânsito para a inconstitucionalidade", mas a revisão deve ocorrer em prazo maior (180 dias), assegurando equilíbrio entre sustentabilidade ambiental, responsabilidade fiscal e segurança alimentar. 

 

Pela parte

O advogado Lauro Rodrigues de Moraes Rego Júnior, representante do Partido Verde, abriu sua manifestação resgatando a origem histórica das subvenções fiscais aos agrotóxicos, instituídas pelo Programa Nacional de Defensivos Agrícolas, criado em 1975 durante o governo Geisel.

Segundo ele, a política implementada sob o regime militar, sob o pretexto de fomentar o crescimento nacional, consolidou "um modelo de dependência e devastação ambiental" que perdura há meio século.

Rego Júnior afirmou que as desonerações fiscais beneficiam grandes produtores e empresas estrangeiras, mantendo o Brasil em posição de "dependência produtiva".

Citou a ADPF 910, julgada pelo STF há dois anos, que reconheceu os "nefastos efeitos do uso de agrotóxicos", e criticou a ausência de referência a esse precedente nas manifestações recentes.

O advogado apresentou dados da Câmara dos Deputados, da Anvisa, do Ibama e do ministério da Agricultura, apontando falhas estruturais na fiscalização e um aumento de 150% na comercialização de agrotóxicos entre 2007 e 2014, além de 84 mil casos de intoxicação notificados no período.

Para ele, "a pergunta que fica é qual projeto de país se pretende sustentar com uma política de subvenção que dura meio século".

 

Pró defensivos agrícolas

O advogado Rodrigo de Oliveira Kaufmann, do escritório Sturzenegger e Cavalcante Advogados Associados, representando a CNA - Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, defendeu a constitucionalidade das desonerações fiscais, sustentando que sua revogação elevaria em R$ 16 bilhões ao ano o custo de produção e impactaria preços e segurança alimentar.

Afirmou que os defensivos "não são itens de luxo, mas insumos essenciais", e que a tributação excessiva reduziria a produtividade e estimularia o desmatamento.

Ressaltou que o Brasil adota controles rigorosos, alinhados a padrões da FAO, OMS e ONU, e que políticas semelhantes são comuns em países da OCDE.

Pela CropLife Brasil, o advogado Túlio Freitas Coelho, da banca Trench Rossi Watanabe, afirmou que a concessão de incentivos fiscais é ato discricionário dos Poderes Executivo e Legislativo, não cabendo ao Judiciário interferir.

Disse que a EC 132/23 apenas consolidou tratamento já previsto na Constituição, sem violar cláusulas pétreas. Segundo ele, o uso regular e fiscalizado dos produtos não gera danos ambientais relevantes, e a elevação de tributos poderia favorecer o mercado ilegal, hoje responsável por cerca de 25% dos defensivos utilizados.

O advogado Felipe Costa Albuquerque Camargo, pela Abifina e pela Aprosoja Brasil, afirmou que o uso de defensivos decorre de necessidades agronômicas e climáticas, não de incentivos econômicos.

Destacou que todos os produtos passam por avaliação técnica de Anvisa, Ibama e ministério da Agricultura, e que a lei 14.785/23 reforçou os controles ambientais.

Defendeu que a reforma tributária foi resultado de debate democrático e que as desonerações asseguram segurança alimentar e estabilidade produtiva.

O advogado Eduardo Maneira, pela Sindveg, sustentou que a EC 132/23 não afronta o princípio da seletividade, aplicável apenas ao ICMS e ao IPI, e que os novos tributos (IBS e CBS) seguem o princípio da neutralidade.

Explicou que o art. 9º da emenda tem eficácia limitada, dependendo de lei complementar para regulamentar reduções de alíquota, e ressaltou que 80% dos defensivos são usados em quatro commodities estratégicas - cana, soja, milho e algodão.

O advogado Flávio Henrique Unes Pereira, pela Fiesp, destacou a necessidade de equilíbrio entre o direito à saúde e ao meio ambiente e o direito à alimentação e ao desenvolvimento nacional.

Defendeu a legitimidade técnica da Anvisa, Ibama e ministério da Agricultura, citando precedentes do STF que reconhecem sua competência regulatória.

Comparou o controle de agrotóxicos ao de medicamentos e afirmou que os instrumentos fiscais da política agrícola, previstos no art. 187 da CF, autorizam os benefícios questionados.

O advogado Luciano Gonçalves Faria Júnior, do escritório João Domingos Advogados, pela Abdagro - Associação Brasileira de Defesa do Agronegócio, alertou que a tributação sobre defensivos elevaria o preço dos alimentos e afetaria produtos básicos, como o feijão, cujo custo com defensivos representa 19% do total de rodução.

 

Ressaltou que o novo regime tributário ampliou a carga sobre produtores antes isentos e pediu cautela do STF para não agravar o ônus sobre o campo e os consumidores.

Por fim, o advogado Eduardo Lourenço Gregório Júnior, representando a Absolo e a AMA Brasil, lembrou que a redução tributária para insumos agropecuários foi amplamente aprovada pelo Congresso Nacional (461 votos a 24), inclusive com apoio de partidos autores da ação.

Rebateu argumentos da inicial, afirmando que os produtos apontados como nocivos não são autorizados no Brasil, e defendeu que havendo fiscalização eficaz, não há razão para eliminar o benefício fiscal.

 

Contra defensivos agrícolas

O defensor público Gustavo Zorteia da Silva, da DPU, defendeu a procedência da ação, afirmando que os incentivos fiscais aos agrotóxicos violam cláusulas pétreas da CF, por afrontarem os direitos fundamentais à saúde e ao meio ambiente equilibrado.

Com base em estudos da Abrasco - Associação Brasileira de Saúde Coletiva e dados científicos recentes, apontou a relação direta entre o uso de agrotóxicos e o aumento de doenças, contaminação de águas e perda de biodiversidade.

Comparou a concessão de benefícios a pesticidas à hipótese de isentar cigarros e bebidas alcoólicas, produtos igualmente nocivos, e observou que as desonerações favorecem a produção de commodities voltadas à exportação, e não alimentos básicos.

Mencionou experiências internacionais - como Bélgica e França, que adotam tributação diferenciada conforme a toxicidade - e elogiou o voto do ministro André Mendonça, que propõe uma transição gradual para políticas fiscais ambientalmente sustentáveis.

A advogada Jaqueline Andrade, pela Terra de Direitos, reforçou a tese da inconstitucionalidade das desonerações, qualificando a política fiscal vigente como "um retrocesso ambiental e sanitário".

Afirmou que o Estado não pode subsidiar produtos que contaminam o solo, a água e a saúde da população, e que a renúncia fiscal anual supera R$ 22 bilhões, valor muito superior aos orçamentos da Anvisa e do Ibama.

Segundo ela, os incentivos beneficiam grandes propriedades voltadas à exportação, responsáveis por mais de 60% do consumo de agrotóxicos, enquanto a agricultura familiar -responsável por mais de 80% da produção de alimentos básicos - utiliza menos de 2%.

Defendeu que manter as isenções inverte o princípio da capacidade contributiva, favorecendo quem mais polui e pode contribuir.

Encerrou lembrando que sete dos dez agrotóxicos mais vendidos no Brasil são proibidos na União Europeia e pediu que o STF reafirme o dever do Estado de proteger a saúde, o meio ambiente e as futuras gerações.

Fonte: www.migalhas.com.br

 

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