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STF invalida lei que permite a municípios barrarem mototáxis
STF, no plenário virtual, invalidou a lei 18.156/25 do Estado de São Paulo, que confere aos municípios a competência para regulamentar e, eventualmente, proibir o serviço de mototáxis e aplicativos de transporte individual privado com motocicletas.
O colegiado acompanhou voto do relator, ministro Alexandre de Moraes, segundo o qual a norma é inconstitucional.O caso
A ação foi proposta pela CNS - Confederação Nacional de Serviços, que alegou que a norma paulista invadia competência privativa da União prevista no art. 22, IX e XI, da Constituição, além de violar os princípios da livre iniciativa, livre concorrência e defesa do consumidor.
A entidade argumentou que o transporte por aplicativos é atividade econômica privada, e não um serviço público, e que as exigências criadas pela lei, como habilitação específica, limite de idade dos veículos, certidão de antecedentes, contratação de seguro e inscrição no INSS, representavam barreiras de entrada no mercado.
Em defesa da norma, a Assembleia Legislativa de São Paulo sustentou que a lei trata de matéria de interesse local e de proteção à saúde e ao consumidor, nos termos do art. 24 da CF.
O governador paulista também afirmou que a regra complementa a legislação federal sobre consumo e saúde pública, citando dados do Ministério da Saúde e do sistema Infosiga.SP, que revelam aumento de acidentes e internações de motociclistas.
A AGU e a PGR, no entanto, se manifestaram pela inconstitucionalidade da norma, sustentando que ela usurpa a competência legislativa da União e contraria precedentes do STF.
Em setembro de 2025, ministro Alexandre de Moraes, relator da ação, deferiu medida cautelar suspendendo a eficácia da lei até o julgamento definitivo da ação.
Voto do relator
Moraes votou para converter o referendo da medida cautelar em julgamento definitivo de mérito e declarou inconstitucional a lei paulista. Para o ministro, a norma invadiu a competência privativa da União para legislar sobre trânsito e transporte.
S. Exa. destacou que a lei 12.587/12 já fixa as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, conferindo aos municípios apenas a função de regulamentar e fiscalizar o serviço dentro dos parâmetros federais.
Moraes lembrou ainda que o STF possui jurisprudência consolidada sobre a impossibilidade de os Estados editarem normas próprias sobre transporte individual de passageiros, citando as ADIns 2.606, 3.135, 3.136 e 4.961.
Segundo o ministro, a lei cria "barreiras de entrada indevidas", ao condicionar o exercício da atividade à prévia autorização municipal, e que o transporte por aplicativos é uma atividade econômica, não um serviço público.
Com base em dados do IBGE, Moraes apontou que quase 1,7 milhão de brasileiros têm nas plataformas digitais o principal meio de sustento, e que mais da metade atua na região Sudeste, o que reforça a relevância econômica e social da atividade.
Conforme afirmou, a norma viola os princípios da livre iniciativa, da livre concorrência e da busca do pleno emprego e acaba por limitar alternativas de mobilidade, especialmente para os consumidores de baixa renda.
"Não é defensável que o legislador ignore uma série de princípios e fundamentos constitucionais, a fim de impor restrições desarrazoadas, ao argumento de proteção consumerista e da saúde pública", ressaltou.
O entendimento foi acompanhado pelos ministros Dias Toffoli, Edson Fachin, Cármen Lúcia, André Mendonça, Gilmar Mendes, Nunes Marques e Luiz Fux.
Leia o voto do relator.
Ressalvas
O ministro Flávio Dino acompanhou o relator, mas com ressalvas. S. Exa. destacou que, embora concorde com a inconstitucionalidade da lei estadual, é necessário refletir sobre a proteção social aos trabalhadores de aplicativos.
Segundo Dino, é preciso debater direitos básicos como férias, repouso semanal remunerado, seguro contra acidentes, aposentadoria e licenças maternidade e paternidade, especialmente diante do hibridismo das relações de trabalho.
Para o ministro, a "gamificação do trabalho" não pode conduzir a paradigmas insustentáveis. Conforme alertou, os trabalhadores extenuados e pressionados por metas podem comprometer a segurança dos consumidores e demais usuários das vias.
"Seres humanos não são personagens de videogame, com múltiplas 'vidas' a serem exploradas ao máximo e descartadas como um produto de consumo qualquer."
Dino ainda observou que, conforme o art. 170 da CF, a ordem econômica deve compatibilizar livre iniciativa e valorização do trabalho humano, assegurando existência digna e justiça social, princípios que também vinculam as empresas de transporte por aplicativo.
Leia o voto de Dino.
Já o ministro Cristiano Zanin, embora tenha acompanhado o relator, apresentou ressalva ao destacar que os municípios possuem competência para regulamentar e fiscalizar a atividade, desde que observados os parâmetros fixados pela legislação Federal.
Para Zanin, a lei 12.587/12 atribui aos municípios a função de regulamentar e fiscalizar o transporte remunerado privado individual, nos limites dos parâmetros fixados pela União
O ministro afirmou que, considerando as peculiaridades locais, os municípios podem estabelecer critérios e exigências próprias, desde que respeitem a lei federal.
Leia o voto de Zanin.
- Processo: ADIn 7.852
fonte: www.migalhas.com.br