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STJ valida acesso a e-mails armazenados em interceptação telemática
A 6ª turma do STJ, por maioria, manteve a validade das provas obtidas por meio de interceptação telemática que incluiu o acesso a e-mails e arquivos armazenados dos investigados. Para o colegiado, a decisão judicial de primeiro grau autorizou expressamente tanto o monitoramento das comunicações quanto a quebra de sigilo de dados.
Ficou vencido o relator, desembargador convocado do TJ/SP Otávio de Almeida Toledo, que considerou as medidas juridicamente distintas e, por isso, defendia a nulidade do acesso retroativo às mensagens eletrônicas.
Ao abrir divergência, o ministro Sebastião Reis Júnior destacou que tanto o pedido da autoridade policial quanto o parecer do MP contemplavam expressamente o acesso a dados armazenados. Segundo S.Exa., o juízo de origem aplicou de forma conjunta a lei 9.296/96, que trata das interceptações de comunicações, e o Marco Civil da Internet, reconhecendo a legitimidade de ambas as medidas.
Entenda o caso
Os investigados respondem por suposta fraude e abuso na administração de sociedade por ações, associação criminosa e indução a erro em processo de recuperação judicial, condutas que configurariam o delito previsto no art. 168 da lei 11.101/05.
Durante a apuração, foi deferido pela 5ª vara Criminal de Curitiba o pedido de interceptação das comunicações eletrônicas, pelo prazo de 15 dias.
A defesa alegou que a decisão judicial autorizava apenas o monitoramento prospectivo das comunicações, sem incluir o acesso a mensagens e dados antigos, como e-mails arquivados e arquivos no serviço OneDrive da Microsoft.
Sustentou que o acesso retroativo configurou quebra indevida de sigilo telemático, com violação ao art. 5º, XII, da CF, e requereu a nulidade das provas e o desentranhamento do material obtido.
O TJ/PR denegou o habeas corpus, entendendo que a decisão também abrangia o acesso aos dados armazenados, o que levou ao recurso ao STJ.
Interceptação e quebra de sigilo são medidas distintas
O relator, desembargador Otávio de Almeida Toledo, votou pelo provimento do recurso, com o objetivo de declarar nulos os elementos colhidos a partir do acesso aos dados armazenados. Segundo o relator, a interceptação telemática, monitoramento em tempo real, e a quebra de sigilo, acesso a informações prévias, são medidas distintas, técnica e juridicamente.
Para o relator, a autorização dada se referia apenas à interceptação e não poderia ser interpretada como permissão para o acesso retroativo. Assim, entendeu que houve violação à legalidade, tornando ilícitas as provas obtidas sem autorização judicial específica.
Decisão autorizou expressamente ambas as medidas
Em voto-vista, o ministro Sebastião Reis Júnior divergiu. Para ele, a decisão de primeiro grau foi clara ao autorizar tanto o monitoramento quanto o acesso a arquivos e mensagens armazenadas, conforme solicitado pela autoridade policial e apoiado pelo MP.
Segundo o ministro, o juízo de origem aplicou de forma concomitante a lei 9.296/96, que trata das interceptações de comunicações, e o Marco Civil da Internet, que regula o fornecimento de dados armazenados, reconhecendo a legitimidade de ambas as medidas.
A controvérsia se limitava a definir se a autorização judicial - válida por 15 dias - também abrangia dados anteriores à sua concessão. Após analisar o teor da decisão, os pedidos e o parecer ministerial, o ministro concluiu que a autorização não se restringiu ao fluxo futuro das comunicações.
Tanto o requerimento policial quanto o parecer do MP, observou, solicitaram de modo expresso o fornecimento de e-mails, contatos, registros de IP e arquivos mantidos no OneDrive, elementos considerados imprescindíveis para a elucidação dos fatos investigados - crimes de fraude e abuso na administração de sociedade por ações, associação criminosa e irregularidades em processo de recuperação judicial.
O ministro reconheceu que a decisão poderia ter sido mais detalhada quanto à forma de execução, mas afirmou que o conteúdo dos autos não deixa dúvidas sobre o alcance da autorização, que incluía também os dados armazenados.
Para Sebastião Reis, a limitação temporal prevista na legislação se aplica ao monitoramento de comunicações em curso, não ao acesso a informações anteriores. Dessa forma, não houve extrapolação nem ilicitude.
Ao concluir o voto, afirmou que "sustentar que a imposição de prazo para o monitoramento das comunicações telemáticas demonstra que a autorização judicial se limita a tanto é argumento frágil, perto da determinação constante da mesma decisão, de fornecimento de conteúdos de e-mail, contatos de e-mail, detalhes de registro do OneDrive, logs de IP de acesso, arquivos armazenados e registros de transações".
Com o impedimento do ministro Rogerio Schietti Cruz e a suspeição declarada do ministro Og Fernandes, foi convocado o ministro Joel Ilan Paciornik, da 5ª turma, para compor o quórum.
Paciornik acompanhou a divergência e ressaltou que, embora as medidas sejam distintas, ambas podem ser autorizadas no mesmo ato judicial, desde que respeitados os requisitos legais. Destacou ainda que, mesmo sem menção explícita às duas leis (Lei 9.296/96 e Marco Civil da Internet), a decisão contemplou os dois pedidos, como se observa do contexto dos autos.
O ministro Antonio Saldanha Palheiro também acompanhou a divergência, ressaltando que não é imprescindível ao juiz transcrever cada base legal quando estas decorrem logicamente dos pedidos e da legislação aplicável.
"Não há dúvida quanto à intenção e ao conteúdo da decisão do juiz, que foi antecedida pela requisição policial e ratificada pelo Tribunal local", afirmou Saldanha.
Resultado
Por maioria, a 6ª turma negou provimento ao recurso, mantendo a validade das provas obtidas e reconhecendo a legalidade da decisão que autorizou o acesso a e-mails e dados armazenados.
Ficou vencido o relator, Otávio de Almeida Toledo. O acórdão será lavrado pelo ministro Sebastião Reis Júnior.
Processo: RHC 214.389
Fonte: www.migalhas.com.br